PEDALAR COMO TRANSPORTE

Amigos...

Acredito que a forma mais interessante de divulgar o uso da bicicleta como meio de transporte é apresentar exemplos disto. Sabemos que, em Recife, muita gente faz uso da bicicleta para ir ao trabalho, porém a imagem destas pessoas é sempre associada a um perfil de profissional de baixa renda, que usa a bicicleta para economizar com o transporte público. Os profissionais mais bem colocados associam sempre a bicicleta com lazer e fazem pouco ou nenhum caso do uso dela como meio de transporte válido e extremamente eficiente na nossa cidade. Em função da topografia e das distâncias médias que precisam ser percorridas, Recife mostra-se ideal para este veículo. É uma cidade plana, com poucas elevações significativas e cujas distâncias médias casa-trabalho ficam, em sua grande maioria, em menos de 10 km.

Neste primeiro trabalho desta série, entrevistamos o EURICO DA FONTE FRANCA, 52, empregado da área de Tecnologia da Informação da PETROBRÁS, ciclista, trilheiro, fotógrafo, organizador do Corujaqueira e participante de outros grupos que pedalam por Recife, semanalmente, como o APS. Vamos a ela.

Eurico e Socorro, ambos ciclistas que utilizam a bicicleta como meio de transporte em seu dia a dia. EURICO FRANCA P&O: Há quanto tempo você usa bicicleta como meio de transporte diário? EURICO: Eu já pedalo há muitos anos, mas só em 2008 foi que comecei a usar a bicicleta para ir pedalando para o trabalho. E agora em 2009 aumentei a quantidade de dias que vou pedalando para três ou quatro vezes por semana. P&O: Qual a distância média diária que vc faz para ir e voltar ao trabalho? EURICO: Somando o percurso de ida e de volta, eu pedalo uns 23 km diariamente. P&O: De onde você sai, onde é seu local de trabalho e quais os bairros que vc atravessa para ir e voltar? EURICO: Eu moro no bairro da Torre. Sigo pela Av. Real da Torre, passo pelos bairros da Madalena, Afogados e Imbiribeira. Para chegar em Boa Viagem onde fica meu trabalho, entro na Rua Joaquim Bandeira, que é a paralela da Av. Antônio Falcão. Passo na lateral e contorno o Hiper Bompreço. Chego ao Empresarial Center II, perto do Shopping Center Recife. Pedalando devagar e respeitando as leis de transito da Torre para Boa Viagem, realizo o trajeto em 35 a 40 minutos. P&O: Qual a infraestrutura que vc dispõe no seu local de trabalho para acolhê-lo como ciclista, tipo bicicletário, chuveiros, armários próprios, segurança, etc? EURICO: Durante o expediente a bicicleta fica guardada no subsolo do empresarial que tem vigilância permanente. Um vestiário com chuveiro e um armário. É bem tranqüilo para tomar um banho e trocar de roupa. P&O: No subsolo? EURICO: Não. No mesmo andar que fica o escritório. P&O: No seu dia a dia, qual seria a opinião de seus colegas sobre a sua opção de usar a bicicleta como meio de transporte? EURICO: No inicio todos me viam como um doido. Talvez até agora alguns ainda continuem me vendo assim [risos]. Mas eu tenho exposto minhas motivações e a forma correta de pedalar no trânsito. Os mais próximos já estão acostumados com esta minha loucura... É mas ou menos por ai [risos]. P&O: Você conseguiu influenciar alguém para também usar a bicicleta como meio de transporte? EURICO: Bom, acho que acabo de certa forma influenciando alguém já sendo um exemplo. Mas no meu círculo de amizades ou trabalho não conheço ninguém que tenha tomado esta atitude. Espero que isto mude. P&O: Quando se fala em pedalar para o trabalho, surgem sempre problemas como calor, suor, desrespeitos no trânsito, etc. Quais são as suas grandes dificuldades do seu dia a dia pedalando para o trabalho? EURICO:Todos podem pensar que são os motoristas. Mas por mais incrível que pareça são os "pedaleiros", as carroças e as pessoas fazendo Cooper ou caminhando. Todos eles sempre na contramão. Este posicionamento deles acarreta uma incerteza de em que lado eu devo cruzar por eles. Às vezes, isto faz com que eu tenha que me desviar rapidamente para a faixa onde os carros estão passando em velocidade. P&O: Quais são, na sua opinião, as maiores vantagens de usar a bicicleta como transporte diário? EURICO: Em primeiro lugar certamente o benefício que isto trás a saúde. Todas minhas taxas estão boas. A sensação de estar realizando algo pelo planeta e pelas futuras gerações é também muito gratificante. Pode parecer meio utópico, mas é só você começar a pedalar para sentir isto também. Pedalar entre minha casa e o trabalho, um percurso de uns 23 km por dia é excelente. P&O: Você sugeriria algum ponto para a prefeitura implementar que melhorasse a sua rota diária? EURICO: Com certeza seriam as ciclovias. Se possível em toda parte da cidade, mas pelo menos nas principais vias – as artérias principais. Citaria algumas Imbiribeira, Av. Agamenom Magalhães, Av. Abdias de Carvalho, Av. Recife, Av. Norte, etc. Só para citar algumas em Recife. Estas seriam as principais grandes avenidas que serviriam como corredores. Facilitando a interligação entre os extremos e funcionando de ligação entre diversos bairros. Seguramente iria incentivar até coragem as pessoas de irem ao trabalho de bicicleta. P&O: Todos sabemos a lacuna que é a educação para o trânsito responsável. Vc tem alguma sugestão de como melhorar o nível de informação dos "pedaleiros"? EURICO: Deveria existir uma maciça e constante campanha educacional via rádio e televisão. Pois são os dois meios de comunicação que vão atingir a estas pessoas de forma mais eficiente. Os Arte-educadores do DETRAN poderiam ser parte desta campanha. Todos que conheço os adoram e sempre prestam atenção na mensagem que eles passam. Nas escolas, públicas e privadas, este assunto poderia ser abordado também. As crianças não têm resistência para aprender nada! P&O: Eu sei com certeza que você tem carro. Você consegue definir com exatidão quando o uso do carro para ir e voltar ao trabalho é indispensável? Ou isto nunca ocorre e sempre é possível o uso da bicicleta? E na vida social, quando se justifica o uso do carro, do ônibus ou da bicicleta? EURICO: Com relação ao trabalho, eu acho que apenas em dias que estiver chovendo ou que a pessoa tiver algum compromisso em outros locais antes ou depois que exija estar bem vestido e arrumado. Visita a um cliente, por exemplo. O que não é o meu caso. Sigo sempre direto de casa para o trabalho. Outra situação que não permite o uso da bicicleta é quando a pessoa está debilitada ou doente. Hoje em dia eu uso o carro de forma muito responsável. Nos finais de semana meu carro fica praticamente parado. Atualmente eu uso a bicicleta não só para a ida e volta ao trabalho. Atualmente uso também para outros deslocamentos, por exemplo, quando vou visitar meus pais na casa deles na Ilha do Leite, etc. Só estou utilizando estritamente o necessário mesmo, uma festa, sair com a família, fazer compras, estas coisas. P&O: Vc já utilizou o sistema de transporte público de Recife [ônibus, Metrô, vans?]? Como você analisaria este sistema e seu relacionamento com o ciclista e com o portador de bicicleta que deseje usar os meios de transporte de forma integrada? EURICO: Eu quase não usei o sistema de transporte coletivo. Mas acredito que irei realizar o meu sonho de conseguir ver, aqui em Recife, a integração dos ônibus e do metrô com os ciclistas. Onde você possa pegar a sua bicicleta, pedalar até uma estação de metrô e embarcar junto com a bicicleta. Para quando descer poder realizar o resto do seu trajeto pedalando. Do mesmo jeito com os ônibus. Como já acontece em muitos países da Europa e mundo afora. Em São Paulo já existe algo iniciando neste sentido. P&O: Como todo ciclista, você deve ter desenvolvido algumas técnicas próprias para movimentar-se no trânsito. Você tem alguma dica destas para dividir com a gente? EURICO: Um conselho que seria o primeiro e principal. E queria que você colocasse ele em letras maiúsculas e em negrito - "NUNCA PEDALAR PELA CONTRAMÃO. PEDALAR SEMPRE PELO LADO DIREITO DA FAIXA DA DIREITA", faixa que é destinada aos veículos mais lentos.. O segundo e conhecer e respeitar todas as leis de trânsito. P&O: Finalmente, vc deixa algum conselho que você julgue importante para os demais ciclistas? EURICO: Em primeiro lugar respeitar sempre o pedestre e os motoristas. Ter ciência que nesta convivência os carros são mais fortes e que os ônibus e caminhões são mais fortes ainda. Eu, neste meu trajeto diário, não disputo com nenhum deles. Respeitar para ser respeitado. Este é o lema. Quando vejo uma pessoa sinalizar parada com a mão para um ônibus que vem atrás de mim, analiso se tenho condições de passar da parada de ônibus antes dele chegar. Se da para acelerar o ritmo e passar para deixar a parada livre. Caso contrário, eu paro e espero o passageiro subir e o ônibus sair. Ficando sempre no canto da faixa da direita para que o motorista me veja pelo seu retrovisor. Se você resolve passar pela direita quando o ônibus estiver parado, vai bater nos passageiros que sobem e descem do coletivo. Se você passa pela esquerda do ônibus, corre o risco dele sair e te jogar para a faixa onde os carros estão em maior velocidade. E ai onde acontecem a maioria dos acidentes. Parar antes das faixas de pedestres quando tiver pedestres para atravessar. Sempre parar nos sinais e cruzamentos. ------------- Obrigado Eurico pela disponibilidade.